CASO CAFUNFO NÃO DEVE ”BELISCAR” RELAÇÕES ENTRE ANGOLA E ALEMANHA, EMBAIXADORA ANGOLANA PARA D.W. ÁFRICA EM BERLIM

Embaixadora de Angola na Alemanha define relações bilaterais como excelentes. À DW, Balbina da Silva fala ainda sobre andamento da compra de barcos-patrulha e mostra-se otimista com eventual votação na diáspora.

Em entrevista exclusiva à DW África em Berlim, a embaixadora de Angola na Alemanha e embaixadora não-residente na República Checa garante que os incidentes em Cafunfo não irão beliscar as relações bilaterais com a Alemanha.

Balbina Malheiros Dias da Silva revela ainda que as negociações para a compra de barcos-patrulha alemães por Angola continuam em andamento.

A diplomata, que assumiu a Embaixada em Berlim em outubro de 2019, diz considerar o pedido de revisão pontual da Constituição angolana pelo Presidente João Lourenço como um avanço para “uma verdadeira democracia” no país. Especificamente no ponto que toca ao direito de voto dos angolanos no exterior, Balbina Malheiros Dias da Silva revela ter recebido a notícia com satisfação, reconhecendo que o registo eleitoral será um desafio.

DW África: No passado dia 2 de março, o Presidente de Angola, João Lourenço, anunciou uma revisão pontual da Constituição. A alteração inclui a consagração do direito de voto aos angolanos residentes no exterior, um desejo antigo de muitos angolanos que vivem na diáspora. Como recebeu essa notícia?

Balbina Malheiros Dias da Silva (BMDS): Eu recebi essa notícia com bastante satisfação e naturalmente também com alguma preocupação, porque isso com certeza vai exigir da Embaixada [de Angola em Berlim] organização no sentido de podermos registar esses angolanos para o exercício do voto. Mas, apesar de os angolanos estarem fora de Angola, gozam dos mesmos direitos de qualquer angolano que esteja no país. Portanto, votar é um direito que eles têm e o Presidente João Lourenço apenas fez jus ao direito que esses angolanos têm.

DW África: Assumiu a Embaixada de Angola em Berlim em outubro de 2019 com a intenção de se aproximar da comunidade angolana. Houve avanços nesse sentido?

BMDS: Sim, houve avanços nesse sentido. Não da forma como eu gostaria, porque logo a seguir surgiu a pandemia. Mas temos um contacto muito estreito com a nossa comunidade, até porque a nossa comunidade aqui está organizada. Estão nos 16 estados da Alemanha. De tempos em tempos, reunimo-nos com a comunidade – até para saber quais são as preocupações, quais são os problemas – e damos o apoio necessário à nossa comunidade. O ideal seria que nos aproximássemos mais, que eu pudesse ter um encontro pessoal com a minha comunidade, em vez de fazer encontros virtuais, que é o que temos estado a fazer. Mas estou convencida de que bons dias virão e teremos oportunidade de ter encontros presenciais. Defender e proteger a minha comunidade sempre esteve e estará na minha agenda.

DW África: Passando agora para temas das relações bilaterais com a Alemanha. Em fevereiro, a embaixadora da União Europeia (UE) em Angola, Jeanette Seppen, manifestou as sérias preocupações do bloco com os incidentes em Cafunfo, num encontro que teve com o ministro angolano da Justiça e Direitos Humanos. A UE pediu um inquérito sobre o que se passou em Cafunfo no dia 30 de janeiro. De que forma incidentes como este podem afetar as relações com a União Europeia e com a Alemanha, em particular?

BMDS: Eu penso que, antes de tudo, teremos que analisar o contexto em que estes incidentes ocorrem. Não é normal que cidadãos armados ataquem uma esquadra. Tanto em Angola, como na Alemanha e mesmo em qualquer outro país, [em] países da União Europeia, isto não é normal. Naturalmente que a Polícia reagiu ao ataque. O Presidente João Lourenço pediu que se instaurasse um inquérito e, se houve excessos da parte da Polícia, naturalmente esses serão responsabilizados.

Mas acho que não é normal que indivíduos civis ataquem uma esquadra. Não é normal. Se isso acontecesse aqui na Alemanha, talvez fosse considerado um ato terrorista. E naturalmente que a Polícia não havia de cruzar os braços, teria que fazer alguma coisa, e foi o que se fez. Não creio que isto é razão para que as nossas relações sejam beliscadas. Não. Aliás, há muitas demonstrações do Governo angolano de que estamos a caminhar para uma verdadeira democracia. Basta ver as propostas feitas pelo Presidente da República para a revisão pontual da Constituição. Portanto, isto é um avanço na nossa recente democracia.

DW África: O Presidente João Lourenço esteve na Alemanha em 2018. Em 2020, recebeu a chanceler alemã Angela Merkel em Angola. Um dos temas da cooperação bilateral é a compra de barcos-patrulha alemães por Angola – um negócio que Angola tenta fechar desde 2011. Houve avanços nesta negociação?

BMDS: Que eu saiba, este assunto ainda está em Angola, não houve grandes avanços. Mas, com certeza, haveremos de resolver e comunicar às autoridades alemãs tão logo tenhamos tomado alguma decisão relativamente a isso.

DW África: Aguarda-se uma decisão agora pelo lado de Angola?

BMDS: Sim, aguarda-se uma decisão.

DW África: Como descreveria as relações atuais entre Angola e a Alemanha?

BMDS: As relações entre Angola e a Alemanha são excelentes. Temos uma cooperação estratégica com a Alemanha. É claro que temos também muitos acordos bilaterais assinados com a Alemanha. Precisamos de rever alguns, porque muitos desses acordos ainda não estão em funcionamento [alguns acordos foram assinados no tempo da RDA, República Democrática da Alemanha]. Então, teremos que rever estes acordos e tornar a nossa relação muito mais tangível.

Como sabe, temos uma grande número de empresas alemãs presentes em Angola. São empresas que trabalham com o Governo angolano e que estão envolvidas em grandes projetos com o Governo angolano – é o caso da Siemens e da Gauff e outras empresas que se encontram em Angola.

O Presidente João Lourenço elegeu a Alemanha como o nosso parceiro-desenvolvimento e nós temos que trabalhar para isso, tanto a Alemanha como Angola. Principalmente Angola. A Alemanha não é um país qualquer. A Alemanha é a primeira economia da Europa, é um país extremamente desenvolvido e nós gostaríamos de ter a experiência da Alemanha em várias áreas – na agricultura, na indústria, nas áreas do saber e de formação profissional. Enfim, estou convencida e tenho a certeza que a Alemanha está em condições de nos poder ajudar neste sentido.

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